Aprender pode – e deve – ser divertido, quando a criatividade é permitida.

Faz pouco tempo que assisti o famoso discurso de Steve Jobs na formatura de 2005 da Universidade de Stanford, apesar de já ter ouvido muito falar sobre essa ocasião.

O texto ficou muito famoso porque ele faz um apanhado da sua vida, procurando as mensagens significativas que possa transmitir aos recém formados – logo ele, que não concluiu a universidade.

O desejo de que fizesse universidade foi uma exigência da sua mãe biológica para os futuros pais de Steve, que fizeram de tudo para cumpri-la. As boas universidades americanas custam fortunas, e ele não via sentido em gastar as economias da família na sua formação. Mas Steve não deixou completamente a universidade: assistia apenas as aulas que o interessavam, e catava latas para reciclar a fim de juntar dinheiro para as refeições. Uma dessas aulas livres foi a de caligrafia – algo aparentemente pouco útil, mas a que ele atribui a preocupação com o tipo de letra que utilizou nos primeiros computadores que sua empresa Apple produziu, e que se destacavam pelo visual esteticamente primoroso.

As histórias continuam – o vídeo merece ser assistido. Vale a pena conhecer como aquele estudante que andava descalço pelo campus da universidade se tornou um dos maiores gênios criativos do nosso tempo – são dele as invenções do iPod e do iPhone, entre outras inovações tecnológicas.

Eu gostaria de destacar alguns pontos que ele percorre, fazendo uma relação com a educação.

Primeiro, o fato de não ter se submetido ao ensino formal, escolhendo aquilo que desejava estudar e deixando para juntar os pontos mais para frente. Muitas vezes a escola trata o currículo como se tivesse sido ditado por Deus, e não uma criação humana relacionada ao seu tempo histórico. Quantos assassinatos da criatividade foram cometidos para que diplomas fossem obtidos? O currículo também costuma ser usado como desculpa para já justificar porquê alunos com deficiência intelectual supostamente não se beneficiariam na escola comum, como se apenas um tipo de conhecimento fosse válido e as disciplinas não pudessem ser exploradas de outras formas, menos restritas e mais revolucionárias.

Muitas vezes, encontro professores que não conseguem avançar com um aluno porque não ousam, não experimentam, não são criativos. Penso que boa parte da culpa é da escola e dos cursos de graduação, que literalmente “bitolam” esses profissionais – sabem o que é bitola? Uma medida padronizada, daí o significado de ser bitolado, ou seja, alguém que não consegue ver as coisas de outra maneira. Esse tipo de visão sobre o mundo é extremamente nocivo para a educação – para todos os alunos, e não apenas para aqueles que têm alguma deficiência. Contudo, como pedir que professores e gestores sejam criativos se eles não fazem a menor ideia de como fazer isso?

O ponto alto do discurso de Jobs é a frase “stay hungry, stay foolish”. De difícil tradução para o português, literalmente é algo como “mantenha-se faminto, mantenha-se tolo”. Steve Jobs conta a origem da frase, que aparecia numa enciclopédia de um só volume, tipo um almanaque dos anos 70 ou um Google de papel, como ele chamou.

Manter-se faminto é manter-se sempre em busca. É não se satisfazer com a primeira negativa ou a primeira resposta, ou ainda com o primeiro resultado magro.

É querer mais, buscar a excelência – e isso me parece um desafio fundamental para aqueles profissionais que querem fazer a diferença, principalmente no campo da educação. Ir além, provocar, desafiar os alunos e os currículos, subverter sem medo, comemorar conquistas e partir para as próximas.

Manter-se “foolish” não é ser tolo, mas sim bem humorado e otimista. É saber rir de si mesmo e manter uma atitude positiva diante dos obstáculos. Também tem a ver com manter o olhar do iniciante, daquele que está pronto a aprender e não acha que sabe tudo ou deveria saber. Uma postura preciosa diante do aluno que desafia com seu comportamento ou sua forma de ver o mundo.

Deve ser delicioso ter aula com professores assim. Com certeza, as escolas melhorariam muito o seu clima de aprendizagem. Que Steve Jobs nos inspire.

 

Publicado originalmente em 4 de outubro de 2017

(imagem: StartupStockPhotos – Pixabay)

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